A rua
Eram seis da matina. O vigilante Severino vinha subindo a ladeira em
direção ao centro. Trabalhava a noite e vinha morto de sono. No sentido
contrário vinham os irmãos Ariosvaldo, Reginaldo e mais um menor.
-E aí mano como
vai? Batem-se as mãos como o usual.
-Tô morto cara! Estou
vindo do trampo. Vinte e quatro horas sem dormir. E aí quem é o intruso?
-De menor cara, ele tem
umas idéias aí, ta afim?
-Porra estou fora de
órbita, mas coé?
-Vamos fazer um ganho
agora.
Mostra o tresoitão, por baixo da camisa. De menor saiu hoje, da casa de
custódia, mostra aí mano. De menor levanta a calça. Usa uma tornozeleira eletrônica.
Sorri. Ariosvaldo pega no ombro do outro como fazem os amigos. Fala no ouvido do outro:
-O amigo tá duro pacas,
entende precisa arrumar uns para a sobrevivência e aí demos a ideia da loja lá
do centro. Mesma coisa de tomar doce de criança. Tem uma mina e um segurança
otário entendeu!
-Sei! Mas como vai ser a
comissão?
-Pô cara dividimos em
quatro! Sem apelação!
-Aí! Tô dentro! Qual
minha função?
-Pô meo, De menor vai
chegar na cara dura, arma em riste entendeu. Qualquer coisa de errado ele toma
a frente, sabe como é a lei! Eu vou com a mochila guardando os cobres, meu
irmão fica na esquina e tu fica de retaguarda, certo. Sem vacilo! Qualquer
movimento avisa.
-Falou mano! Conheço a
mina lá de vista! Uma bunda, porra! Se der mole como. Deixa esse agrado pra
mim?
-Qual é malandro, nós é bandido mas temos ética, não
somos estupradores não! Mas se tu quer, depois de pegar nossa grana, pode fazer
o que quiser!
-Quero muito! Já tentei
ficar com ela, mas a fila da puta não quis! Tá na mira!
A loja
Lúcia tirou a blusa e deixou à mostra um seio. Duro. A auréola escura. Pegou
outra blusa com um tom azul turquesa e vestiu com certa dificuldade, já que
usava uma só mão. As pernas longas e malhadas dificultavam o trabalho. Ao mesmo
tempo tirou a calça, a bunda bem torneada, e vestiu de diferente cor para
combinar.
Marlon o segurança, a olhava de meio jota há muito tempo, talvez dali
surgisse um romance, pois ambos se olhavam, e não segurou o riso ao ver Lúcia
com tanta destreza em trocar as roupas dos manequins.
Ele por seu turno pegou todo o dinheiro do caixa, colocou numa bolsa de
plástico escura e se dirigiu a sala onde guardava as notas maiores até o
horário do depósito na rede bancária. Foi quando ouviu o grito:
- Assalto! Todos quietinhos e de mãos para cima.
Marlon só teve o trabalho
de fechar a porta por dentro. Porra! Porra! E agora pensou. Lembrou-se que
deixara a arma na gaveta. Assim o que podia fazer era ficar quieto e rezar.
De menor veio com a arma e apontou para a cabeça de Lúcia.
-Aqui seu pilantra! Abre essa porta e passa todo o dinheiro senão vou
estourar o crânio da mina aqui! Lúcia estremecera.
Enquanto isso Ariosvaldo ia rapidamente enchendo a mochila com peças de
roupa.
Lúcia estava fria. O cano do revólver machucava sua fronte. “Pai nosso
que estais no céu... Não me mate! Por favor!
-Só depende do seu parceiro! Abre essa porta aí! Vou contar até três. Depois o bicho vai pipocar!
-Um...Dois e Pum!
Quando o capitão chegou, tinha cérebro espalhados por todo o teto.
Rádio
O locutor dando ênfase à fala:
-Estou aqui com o Capitão Dagoberto, boa noite capitão! Agradeço sua
presença aqui.
-Boa noite, Áureo, boa noite ouvintes!
-Capitão, conheço seu trabalho, um trabalho árduo, competente, fazendo o
que pode para a segurança do município, queria saber do senhor o que podemos
fazer para melhorar estas estatísticas de terror que hora ou outra aparecem
como esse agora da morte da senhorita Lúcia, vendedora, esse crime bárbaro...
-Olha Sr Áureo, até que esse ano as estatísticas estão favoráveis,
estamos combatendo esses crimes e outros, eu criei a guarda de bairro, coloquei mais homens nas
ruas, dita números, continua: -Mas esses
crimes é de difícil prevenção. A lei é frouxa. Logo os indivíduos estarão
soltos!
-Eles, os assassinos, já estão presos?
-Sim. Meia hora depois do comunicado, saímos em diligencia, e pegamos os
quatro meliantes...
-É verdade que existe um menor?
-Verdade! E como sempre eles confessam o crime! Assumem tudo! A pena
para menores é branda!
O Locutor fica em silêncio. Faz algumas observações a respeito das leis, do
ser humano, da maldade...
-Como se sucedeu a prisão Capitão, eles tentaram fugir? Responda por favor no segundo bloco. Propaganda.
-Ah! Sempre tentam. Sempre que ocorre crime nessa região sabemos que
podem seguir pela rua do rio. Então montamos bloqueio no acesso a uma estrada
vicinal ao Centro. Já havíamos recebido
as características do carro, um fusca ano meia nove, branco, que logo
avistamos.
Fizemos a abordagem e conseguimos
prender todos eles ainda com a arma do crime.
Ele destacou que todos têm antecedentes criminais, exceto o vigilante.
-Eles iniciaram alguma reação?
-Não Sr Áureo, é sempre assim. Quando são cercados parecem criancinhas,
até choram, chamam pela mãe...
-É isso, infelizmente a moça morreu, e agora? Dá sinal para baixarem a musica. Continua: Logo logo advogados,
usarão as brechas da lei que são muitas, colocam esses salafrários em liberdade
e presa mesmo estará a menina Lúcia, dezesseis anos, uma vida inteira pela
frente. Obrigado Capitão Dagoberto, pelo seu trabalho, uma luta constante, que
oxalá um dia consigamos viver em paz. O capitão tece os últimos comentários e...
-Obrigado! Amém!
O contra regra aumenta o volume da música de fundo. O locutor imposta a voz:
-Vocês acabaram de ouvir: Ronda policial. O programa que não tem medo de
falar a verdade doa a quem doer.
Entram as propagandas.
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