quinta-feira, 2 de agosto de 2012

Era a copa do mundo


      



    Estávamos numa mesa ali na barragem, comendo tucunaré frito com cachaça de cabeça. O espelho do açude Mãe d’água estava tremulando. Canoas de pescadores ancoradas as margens.
      Zé das jumentas começou:
      -Olhe! Com certeza a melhor foi a de 82, visse. Sei escalar todinha, na ponta da língua. Pense num  meio de campo porreta: Zico, Sócrates e Falcão. E os laterais Éder, o canhão e Júnior nosso conterrâneo. Futebol arte.
      Nisso entra Dalvinha no bar. Saia curta. Olhamos pros tornozelos dela. Grossos e roliços. Debruça-se no balcão. Pediu uma caixa de fósforos. Talvez tivesse ido ali, para investigar o que falávamos. Cidade pequena cuida da vida alheia.
 Sai rebolando as cadeiras.
      -Viu?
      -O que Boca mole?Perguntei.
      - Ela tá com rolo por aí.
      -Não acredito, digo. Tão novinha!
      Canhoto calado. Mastigava uma posta de peixe. Toma uma talagada e joga o resto paro o santo. No pé do balcão.
      -Rolo com quem, pergunto.
      -Com Severino do Fenemê.
      -Verdade?
      -É.
      -Aquele que faz frete pra João Pessoa.
      -O Próprio.
      -Que é casado e tem dois filhos de peito?
     -Esse mesmo.
      -Vixe!
       Zé das Jumentas dá uma tapa na mesa. Levanta-se e alisa as mãos. Tonho do bar grita lá da cozinha:
      -Mais um tubo de cana?
      -Vê mais um que hoje tô com a gota serena! Vixe! E  demos uma gargalhada.
      -As mulheres cheias de preconceitos comigo e dão para qualquer um?
      -E ela é boa visse! Eu disse.
      -Ai! Ai! Uma potranca completou Zé das jumentas.
      - Será que é caso antigo?
      Manoel da Kombi passa buzinando. Não escuto a resposta de Zé.
      Encho o copo dos três. Canhoto palita os poucos dentes.
      -Também acho que a melhor foi a de 82. Voltei ao assunto de início. Mais técnica. Mas a de 70 tinha na linha Jairzinho, Gérson, Tostão, Pelé e Rivelino. E trouxe o caneco.
      -Oxente! A de 58 trouxe também o caneco disse Zé das jumentas. E tinha Djalma Santos, Didi o “folha seca”, batia uma falta como ninguém, Zagalo e tantos outros bons jogadores. Esfrega as partes.
      -E você Canhoto, qual sua preferida, perguntei cutucando-o com o pé.
      Ele tomou de um só gole a cachaça, fez uma careta, pegou uma siriguela para tirar o gosto, cuspiu no canto e falou:
      -Se vocês jurarem não me interromper darei minha opinião e conto tudo do jeitinho que aconteceu.
      Aceitamos de pronto, pois não era todo dia que Canhoto falava.
       Um palito no canto da boca.
       -Para mim, que sou mais velho, já vi muita coisa, já passei por muitas secas medonhas e já vi Mãe d´água  sangrar mais de três metros na década de sessenta, uma sangria medonha. Digo e repito.  O melhor time que esses olhos que a terra há de comer viram jogar visse, foi o saudoso 4 de abril. Eh! Time porreta aquele. A seleção brasileira e qualquer outro time ficam  aqui ó no chinelo.
      Ficamos de boca aberta. Não esperávamos por essa. Nem ao menos conhecíamos. Continuou:
      - Lá para década de cinquenta. Um time de monstros E no arco advinha quem pegava tudo? Quem? Quem?
      -Vá fale! Gritamos.
      Não sabíamos. Éramos mais moços. Apontou seu dedo seco para mim.
      -Euuuu? Ele riu com pouco dente.
      -O melhor arqueiro que já vi atuar. Seu pai. Saltava como um anjo. Muito melhor do que Ado, Félix, Leão e tafarel. E ainda pegava sem luvas.
      Nisso rebobinei na cabeça toda lembrança como num filme mudo. Aos domingos, eu fazia o dever correndo, em dia de jogos o dinheiro curto, saia de casa mais cedo à procura do melhor lugar para entrar sem pagar. Muitas vezes era pela torrefação de meu tio. Era só pular um muro, passar por baixo das moitas de melão de são Caetano fugir do olhar dos vigias e pular um esgoto a céu aberto. Pronto. Estava no gramado. Era só comprar uns roletes de cana caiana e ficar sugando o suco doce e assistir a partida em pé ou sentados na  beira do gramado. Ainda levava o estilingue para dar uns tiros em algumas lagartixas pelos muros
      Já quando meu pai era o juiz da partida ele tinha a prerrogativa de nos colocar para dentro. E foi com prazer que fiquei sabendo dessa arte de meu pai como tantas outras, como fazer o melhor pião ou carrinho de madeira. Tive o primeiro caminhão com rodas torneadas e feixe de molas da cidade.
      Olha para os lados e tosse seco. Observa as nuvens. Ele sabe quando vai chover.
      -Teve um jogo aqui bem depois da inauguração do cine CAP lá no DNOCS. Por sinal o primeiro filme que passou foi “O corcunda de NotreDame”. Não gostei. A molecada também não. Só os adultos. Depois passou D`Jango. Um faroeste porreta que só vendo. Foi no dia que Mané da padaria foi ver com toda a família. Na ocasião, quando começou uma cena de  tiroteio, -pense num homem doido da gota -,ele como nunca tinha visto aquilo, sacou da arma, e começou atirar para todos os lados.
      Na delegacia em frente do delegado Bigode ele se explicou desse jeito: “O que você faria compadre. Toda sua família correndo risco de morte, eu tinha que fazer alguma coisa, não é?”. 
      Para o delegado não restava alternativa senão libertá-lo, sem antes falar assim: “Seu Manoel aquilo tudo é ficção, são imagens vindo de uma película, em velocidade dá a impressão de movimento essas coisas”. Mas são somente retratos enfileirados.
      Lembrei quando fiz meu primeiro cineminha. Uma lâmpada cheia d água, uma caixa de sapato e uma lâmpada acesa.
      Ele ainda falou: “Pode ser tudo isso, mas que não ponha em risco minha família.”
      E essa história se espalhou e virou piada contada até na sacristia da igreja Santa Rita de Cássia. Quando o Padre Andrade notou que já estava virando chacota, fez um sermão na missa do domingo seguinte, que era o de ramos, a favor dos humildes e simples e defendendo Seu Manuel, que era pai de família exemplar essas coisas.
       Todos nós sabíamos que não era bem assim, que seu Manuel, andava muito pela rua do rio atrás das mulheres, mas não seríamos nós a delatá-lo. Afinal de contas tínhamos nossos pecados.
      Pois então como ia contando, o time 4 de abril que seu pai jogava, ganhava de todos os times da redondeza, como cajazeiras, Souza, Patos, Pombal. Era o terror da região e se qualquer time de bosta desses aí, até mesmo a seleção brasileira viesse aqui no sertão tomava uma surra de nós. A camisa era igual a do flamengo, rubro negra. Uma beleza que só vendo.
      Pois então numa decisão de campeonato contra o time de Souza, lembro-me disso muito bem, o nosso time 4 de abril seria campeão pelo empate. Pois veja, aos quarenta e cinco minutos do segundo tempo o juiz tal de Capitão Estevão teve a coragem de marcar um pênalti contra o time da casa.
      Esse homem é louco pensei, mesmo vendo que foi um lance indiscutível.  Nosso center four que era o Orlandão, tinha a fama de mau desde que deixou um paralítico lá para as bandas de Cajazeiras.  Quando viu o ponta esquerda deles fazendo fila nos nossos rapazes, gritava trisca! Trisca! Trisca! E quando viu que não tinha jeito, ninguém derrubava o curisco fora da área, rosnou lá de trás e gritou deixa. Se o Juiz ouvisse marcaria falta. Nisso quando o baixinho tocou na frente e penetrou na área, Orlandão  pulou com os dois pés no pescoço do arataca.  Era um bostinha de nada, mas veloz que nem a luz. No canto da pequena área onde não nasce grama. Subiu poeira na venta. Ouviu-se um estrondo e um apito. Triiiiiiiiiiiiiiiiii!
      A torcida ficou louca, Pedro pistoleiro sacou da arma, queria matar o Capitão  a todo custo, mas disseram que o tal juiz era militar reformado de Piancó e chegou a turma do deixa disso e por bem tudo se acalmou, pois Piancó e Coremas já vinham em atritos de longa data não era certo continuar essa briga eternamente. Somente Joaquina e suas primas, as meninas da rua do rio ainda gritaram “isso é que é um filho de uma rapariga, merece que pegue um cancro no meio do cu, essas coisas de baixo calão que tanto nos envergonha. Pois bem. Quando tudo acalmou fez-se um silêncio bruto. Só as cigarras cantavam no fim da tarde. O centroavante deles se abaixou, beijou a pelota de couro cru, correu e bateu de canhota. Para a esquerda voou a chuteira e seu pai voou atrás. Não havia observado o fato. O filho da puta do ponteiro quando tinha se abaixado soltara o cadarço da chuteira, no intuito de enganar. Ninguém tinha percebido o engodo, a isca visse? Pois olha. Quando o cara chutou a bola com a direita teu pai já estava batido. Foi aí que eu vi uma coisa que até hoje arrepio ao contar. Veja! Mostra os braços. Seu pai  viu que enquanto  ia voando  atrás da chuteira a bola corria mansamente do lado contrário. O arataca já corria vibrando para sua pequena torcida lá perto das bananeiras quando seu pai, - Canhoto me fitou dentro dos olhos, tomou mais uma talagada e continuou, - Seu pai fez uma coisa que só beija flor faz. Parou no ar e nessa zona morta de segundos, enquanto a bola rolava mansa para lado contrário ele retesou os músculos acostumados no trabalho pesado,parou no ar e daí seguiu voando noutra direção. Quando a bola ia cruzar a linha do gol,  puxou-a pelo rabo. A torcida enlouquecera. Pedro pistoleiro sacou o trinta e oito e ficou atirando para cima, Joaquina e suas primas escandalizaram a cidade ficando no meio do campo só de anáguas e uns jovens pegou seu pai colocou sobre os ombros e num pique só, fizeram a volta olímpica.
Fomos campeões.
25/06/82

sábado, 28 de julho de 2012

O dia em que quase virei político







As semanas que antecedem uma eleição são assim mesmo. Aparecem candidatos coloridos, arrogantes, humildes, ricos, pobres, tristes alegres, astutos, broncos, inteligentes, verdes, vermelhos e por aí vai.
-Ufa! Foi a primeira vez que escrevi tantos adjetivos juntos, sem, no entanto, acho eu,  merecer alguma crítica.

 Lição  número um que vemos nalgum manual de escritor se por acaso existisse um. Escritor é bicho difícil. Verdade. Diz assim: Não use o adjetivo a não ser que seja para mostrar ou esconder o personagem. Impressionante.
Não desligo a televisão. Fico observando os tipos. Uma verdadeira fauna.

Lembrei-me de um dia que meu pai me levou para escolher um pássaro como meu primeiro animal de estimação.
Cheguei à feira, pois lá no interior da Paraíba é assim. Mil gaiolas, pequenas, graúdas, de arame, de palito, com duas janelas, com poleiros  e sem.

Assustei com tanta possibilidade. Mesmo eu criado no mato, acostumado em pegar passarinho no ninho. Criava desde filhote até adulto. Todos ganhavam nome mesmo. De gente sim. E aí viravam membro da família.

Por isso falo que seria o primeiro sim, pois não se contam aqueles que vivem como gente, tendo sua própria vida, seu canto, e quando morria tinha o velório e enterro como mandava o figurino. Lembro-me com saudade da gata Mimi.

Ela era um ser da família. Mais até, pois era a única a sentar-se na cadeira de balanço de papai. Mesmo sabendo que poderia acordar assustada com um grito. Era sempre ás seis quando tocava a sirene do DNOCS. Tinha até uma brincadeira com essa sigla. Falávamos: Deus não olha os cossacos sofrerem.

Continuando:
Nós mesmos, os filhos, se por acaso, sentados, ao toque da sirene levantávamos sem demora, para que o travesseiro esfriasse e ele não falasse assim:

-Diacho! Quem sentou aqui com bunda tão quente? Não queríamos ter a bunda quente.

Mimi não. Ficava ali balançando o rabo e de vez em quando abria os olhinhos e miava como se sonhasse. Quando a porta abria saltava de um pulo e vinha esfregar-se em nossas canelas. Uma vez. Duas.  E voltava olhos fechados alisando o pelo  com prazer.

Depois ia para baixo da mesa onde estava a tigela com seu leite. Dava umas lambidas e pulava a janela  para a vida do quintal. Uma vida imensa. Era lá toda sua vida.  Por baixo das telhas, do pé de goiaba, do coqueiro que tinha rabiscado em seu tronco, nomes, segredos nossos, que ela ia caçar os seus ratos.

Nesse ínterim papai vinha do banho, cheirando a sabonete de coco, as chinelas batendo no cimento liso e antes de sentar  batia o travesseiro, virava ao contrário, e ligava o rádio na hora do Brasil. Eram doze olhos no escuro. Éramos seis. Meus irmãos e Mimi.

Hoje é que sei que aquela música que tanta temia era de Carlos Gomes “O Guarani”. As notícias que me fizeram tremer no fundo da rede quando eu principiava em dormir. Essas notícias vinham sempre acompanhadas dessa música. Mimi também não gostava.
Eram como o estalo de chicote no vazio.

“Assassinaram Kennedy”. Numa voz fanhosa. Não tínhamos a menor ideia de quem ele era na época. Depois soube que era presidente dos Estados Unidos, uma grande nação, essas bostas diziam.

Eu achava que melhor que  o Brasil não havia. Era um país que não tinha terremotos, vulcão nem grandes catástrofes. Somente algumas secas avassaladoras, mas como dizia de nós, o nordestino é um forte. Pensava até que os assassinos sempre têm seus motivos. E já sabia que tudo  girava em torno de interesses.

Depois: “O primeiro homem pisou na lua”. Grande merda  eu pensei na época. Eu já havia pisado em espinho de juá que dói tanto, dá até febre, pisado em xique-xique, mandacaru, em bosta de cavalo que dava frieira entre os dedos. Que glória tinha em pisar na lua?

Lembro-me  de meu pai  direitinho, dizendo:
-É tudo mentira desses americanos pernósticos. Eu sei por que vi a cobra fumar. Eles inventam porque são metidos a grande. Vivem colocando o dedo onde não são chamados. Umas borras bostas isso é que são.

Ainda hoje tem muita gente boa que não acredita que o homem foi na lua. Pergunte ao Manuel da venda. Ele vem com mil impropérios.
Mas voltando ao assunto, jamais havia visto tanto passarinho junto. Tinha azulão, sabiá, trinca ferro, rolinha fogo- pagou, galo de campina, tiziu, coleiro, cancão, canário da terra, pintassilgo. Muitos outros que não lembro agora. De todas as cores e tamanhos. E a cantoria só vendo. Parecia a banda de música no domingo no coreto da Praça de Santa Rita.

Ficava só ouvindo apaixonado. Tinha louro também que falava. Só vendo para crê.
Mas isso são lembranças. Preciso voltar ao tema. Como o pensamento voa, já disseram acertadamente.
Tenho que falar das eleições e dos políticos. Tantas cores. As vozes macias. Ficamos até entusiasmados. Tanta lábia. Vão resolver tudo para nossas vidas. Até parece que ficaremos em boas mãos. Papai falou: “Até  mudinho uma vez ganhou.” E cumpria tudo, pois não prometera nada para ninguém. Era surdo mudo.

 Finalmente escolhi um de plumagem linda e amarela. Levei para casa na mão mesmo. “Não carecia de gaiola, dissera meu pai.” Desde esse dia andava a tiracolo com ele. Acompanhava todos os seus passos. Colocava para dormir bem embaixo de minha rede. Até o medo de escuro eu perdi. Ele ficava por ali catando algo pelo piso. Uma beleza só.

Ganhou nome, chamava-se José, e quando virou adulto transformou-se num enorme frango.

A partir daí não tive mais sossego. Primeiro foi meu pai que queria comê-lo. Chorei uma noite inteira. Venci. Depois eram as visitas, não sei se faziam por gozação, mais era só entrar na sala e falava: “Dazinha, quero almoçar esse frango”. Eu arrumava um berreiro só.
Clarice passou por esse perrengue também. Não. Não era minha namorada não. Até poderia ser se ela quisesse. Achava-a fascinante. É. A Clarice Lispector mesmo. Apaixonei-me por ela quando escreveu: “Sou como você me vê. Posso ser leve como uma brisa ou forte como uma ventania, depende de quando e como você me vê passar”.

Minha mãe tentava explicar que galináceos são criados para ser abatida, a mesma lenga- lenga de sempre que desde a época de Cristo ou até bem antes, se falava, mas nada mudava minha opinião.
E as visitas eram daquelas pessoas que outro já falou. Como se diz delas. Lembrei-me. Recalcitrante. O que é mesmo re-cal-ci-tran-te? Um belo conto. Leiam.

E eu argumentava que tinha pegado amor por ele, essas coisas. Que José era da família já meu amigo íntimo e tal.

E aí foi o dia que quase fui político. Tentaram me comprar como fazem com eles. Prometeram-me  coisas que sempre gostei como ir ao sítio de meu avô nas férias, nadar no rio da turbina, acompanhar os “negros” ferrar o gado de dentro do curral, pular da torre do açude essas coisas que sempre sonhei fazer e nunca deixaram.

 Sou sincero com vocês. Quase sucumbi.  Minha mãe, ela própria, quando veio da capital, fora visitar minha avó Maria mulher de seu Antônio meu avô, que estava internada, trazia nas mãos uma revista de Tarzan. Jogou-a em cima da mesa displicente.

 O título baseado em “As jóias de opar” escrito por  Roy Thomas e   Desenhos de  John Buscema   by Edgar Rice Burroughs ficou a minha frente como que piscando. A capa era Tarzan em segundo plano pendurado no cipó, na mão empunhando o punhal, e em primeiro plano um grande macaco fugindo com Jane em seus braços.
Sabiam meu gosto pela leitura, e era fã número um dos quadrinhos e filmes de Tarzan.

Meus olhos brilharam com ódio. Fiz beiços e corri para o quarto. Minha mãe foi atrás com as mesmas ladainhas, e meu primo mais chato acompanhou-a justamente para saber o desenrolar dos fatos.
Gritei encolerizado.

-Saiam daqui! Saiam!
-Mas filho, dizia ela com a voz pastosa quando queria conseguir alguma coisa, - é somente um frango que está ficando velho.
Com essa frase bati o pé.

-Se matarem José, frisei bem o nome, sumo daqui para sempre. E comecei a chorar copiosamente. Parecia que a guerra seria perdida.
Meu primo sorriu. Minha mãe arregalou os olhos.
-Esqueça filho. Ninguém matará José só se passarem por cima do meu cadáver. E colocou aqui seu ponto final.  A família toda era dramática.
-Tome a revista, ela disse.

José morreu de velho muito tempo depois. E foi enterrado embaixo da goiabeira. Fiz uma cruzinha de palitos de picolé.
A revista eu li e reli mil vezes. Lia apreciando o detalhe dos desenhos, as curvas de Jane em horas solitárias, a ferocidade do orangotango.

Muito mais tarde compreendi que o intruso era o homem branco, ele estava ali para desmatar a floresta, tirar tudo o que ela tinha de mais sagrado, os animais, as plantas os rios, e depois abandoná-la a própria sorte. Acho que essa revista, que quase serviu como moeda suja, ainda existe e dorme tranquila em algum baú velho.

Voltando ao tema principal que era a escolha de um candidato, - me perdoem, pois quando começo a escrever perco-me em detalhes, que só me diz respeito e a mais ninguém, - um conselho: Nunca escolha candidato pelas  plumagens ou canto.

E principalmente escolha finalmente um candidato, de forma que se não der certo em seu mandato, possa ser abatido e assado num belo jantar.

28/07/2012



quinta-feira, 14 de junho de 2012

Boca fechada não entra mosquito






Era tempo de muito falatório e embustes no congresso. E vendo isso o presidente da casa resolveu imitar um antigo conto, em que numa pequena cidade o rei resolveu abolir a mentira, construindo em cima da ponte que dava acesso a cidade uma forca e quem quisesse entrar era questionado.

Fora editado e publicado a lei. Esta dizia: “Todos serão interrogados. Aqueles que forem pegos na mentira imediatamente serão enforcados em praça pública”.

Houve pesadelos e calafrios. Todos estavam atormentados e com medo de perderem o pescoço foi quando um deles mais astuto resolveu o imbróglio usando as brechas da lei  dizendo assim:

          -Uso o meu direito que está na constituição, que é o direito de ficar calado.
Nunca uma frase fora dita e copiada tanto.

Jamais a forca fora usada.

Agora serve como objeto de estudo e turismo, trazendo povos de outras regiões para observá-la.

Os jovens no intuito de brincadeiras e gozação postam fotos na internet sendo enforcados.
Já no congresso continua o maior silêncio.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

Exclamações de um defunto a respeito da morte





Com a morte de Ivan Lessa, grande cronista; resolvi  fazer-lhe uma homenagem singela. Sei que ele gostava de fazer frases. Claro. É isso que um escritor faz. Frases, orações, períodos, parágrafos...
Mas estas sem exceção  criações minhas. Se não tudo pelo menos a ideia. Se por acaso acharem que nem a ideia,  indago como faz um amigo meu: Tem culpa eu? Tem culpa todo mundo? Se as palavras saem de um mesmo livro que é o dicionário? Pois então não duvidem. Criei,suguei, copiei ou algo assim não importa.


                    Exclamações de um defunto a respeito da morte
Eis:

-Engraçado! Estou rígido, mas ainda penso.
-Não há luz! Talvez porque ainda não cheguei ao inferno.
-Agora pertenço à eternidade.
-Finalmente serei pó, mas que não seja cocaína. Não quero ser ilusão e perdição para ninguém. Já bastam meus textos que são uma droga.
-Um dia acreditei na sorte e na esperança.  Vivi.
 -Trilhei como um pêndulo entre a razão e a loucura. Incrível ninguém ter notado.
-Minha opinião agora é morta.
-Agora já era o amor próprio e o narcisismo.
-Ah! Ah! Agora é que quero ver lá do fundo à cara dos meus credores.
-O que desejo realmente agora é o silêncio.
-Peço delicadamente a quatro amigos ou parente, que suportem meu peso pela última vez.
-Se realmente existir espírito estarei de olhos e ouvidos bem abertos.
-Agora serei só. Um monte de terra e uma cruz em cima.
-O gozo carnal nunca mais. Agora é a plenitude.
-Sinto-me uma estátua. A diferença é que estou na horizontal.
-Venham! A fila andou. Sou apenas um número. Por sorte  com epitáfio.
-Mas, eis  a morte. Oh senhorita, és de verdade quem eu tanto temi?




quinta-feira, 22 de março de 2012

Recém formado

              
 Dentista, formado naquele ano, ainda cheirava ao baile de formatura.
 Sentou-se em frente ao computador e lia os últimos artigos sobre sua área, enquanto olhava demoradamente para sua mão esquerda, onde brilhava um lindo anel de formatura, presente da mãe, dado com muito sacrifício, já que era do lar e o marido, um funcionário publico, mal remunerado.
               Numa placa de bronze, preta, seu nome desenhado: Renato Orgulhou-se deles, coitados! Fizeram de tudo para forma-lo.
               Seu consultório foi montado com o que tinha de mais moderno, graças à confiança dispensada pelos gerentes.
A sala de espera era pequena, mas confortável: Tinha poltronas, revestidas em couro branco e nas paredes quadros de artistas de primeira linha e as luzes ficavam pela metade, dando uma aparência de conforto extraordinário. O som era ambiente.
            Ele olhou pelo circuito interno e viu a secretaria lendo uma revista de modas. Ele era moreno, simpático, vestia-se de branco, contrastando com seus cabelos cortados rentes e escuro. Levantou-se, e andou em direção da janela olhando pela fresta da persiana azul. Via carros passarem em alta velocidade e pessoas andando ligeiras para seus serviços. O consultório era bem localizado e ficava num dos prédios principais da cidadezinha. Repentinamente a secretaria entrou:
        -Um paciente doutor! Mando-o entrar? Esfregava as mãos de contente pelo primeiro.
Ele sorrindo pediu um tempo:
         -Calma Luiza! Deixe-me arrumar! Quero ficar com ar de importância. Vou pegar o telefone , fingir que estou numa conversa importante e ai você manda-o entrar. E assim fico bem na fotografia ok?
         Ela acenou positivamente e saiu. Ele leu uns segundos ainda, e fechou  a pagina  deixando no monitor, figuras de sorrisos brilhantes, com as frases manjadas embaixo: Antes e depois.
         Encostou os lábios no fone, impostou a voz e falou:
         -Por favor, Luiza, mande-o entrar. Imediatamente pegou o telefone.
Entrou um rapaz vestindo uniforme azul com um rolo de fios nas mãos, recebeu-o com um aperto de mão sem largar o telefone. Mandou-o sentar despediu-se de alguém do outro lado do fio,sem antes deixar entender que falava com o prefeito, e com muita intimidade. Despediu-se agradecendo:
          -Muito obrigado. Estarei ai para tomarmos uma cerveja, um abraço. Desligou. Pediu para que sentasse. Quis começar pela anamnese:

            -Qual seu nome?
            -?...
            -Não se preocupe. Não dói nada.
            -Olhe o crachá doutor! Ai diz Severino mas pode me chamar de Lino.
             -Endereço?
             -Aqui mesmo em Ubá, uai!
             -Por favor, Sr Severino. Logradouro, numero e bairro?
              -Fica no buraco quente sem numero. Não gosto muito desse nome não doutor mas tem que falar a verdade ne?
             -Claro!Trabalho. Faz o que?
             -Faço montagem. Desconfiado com alguma coisa. “Tem que fazer isso?”

-Muito importante para o diagnostico.
-Mas doutor...
-Calma Severino não dói nada!
-Eu só queria dizer... Sem deixar falar.
Apalpou toda a mucosa, os lábios e com os dedos na boca de Severino que subitamente retirou-os.
-Você faz o que mesmo?
-Monto telefone, doutor... e vim para isso mesmo! Montar seu telefone.
Renato caiu do pedestal e corou envergonhado.

Noite de Natal


A rua era calma e aristocrática. Pedrinhas multicores coloriam os passeios á noite. Os pisca-piscas brilhavam ininterruptamente, cores variadas. Véspera de natal. 
Data em que os homens fingem umas generosidades fraternas.
 
Nessa rua de riqueza, num elevado, sobressai-se uma casa, melhor dizendo,um palacete; de vastos jardins no centro, cascatas, águas límpidas, de uma fonte artificial de beleza impar. Na entrada desse palacete, uma porta larga e pesada de madeira de lei, esculpida pelos melhores marceneiros, e que em seus pórticos contrastando, via-se duas câmeras, olhos vivos, vigiando noite e dia.
 
Nos jardins, dois grandes portões de ferro, fechavam-na, e sobre os muros altos, corriam em cima, fios elétricos. Verdadeiras muralhas. “Entristecia-me deveras, aquelas casas, com seus muros altos”, - Reféns do medo.
 
Agora, o portão, abria-se automaticamente, deixando passar lentamente, um possante carro preto. O carro deslizou, velozmente, pelas ruas, furtivo, e sem olhar nos olhos dos transeuntes, esgueirava-se como que fugindo, do medo em cada esquina.
 
O homem liga o ar e levanta os vidros. Não olha a paisagem. Comprime as mãos no volante. Liga o radio e procura uma estação. Pensa nos negócios. “Esta indo de vento em popa”. Não pode relaxar. Só pensa nos lucros. Pega o celular e olhando para os lados e nos retrovisores, perscrutando as esquinas (costume adquirido depois de dois assaltos, saiu incólume, graças a sua esperteza), liga um numero do escritório, seu grande escritório de advocacia, ditando as ordens. Estava preste a ganhar mais uma causa, em que, retiraria uma favela inteira de um terreno, em que provara ser de um grande conglomerado, e que no lugar se construiria não aquele “chiqueiro de casas”, mas um grande hotel cinco estrelas. Sorriu! “Esse ano fora fabuloso”. Olhava agora para a grande favela, em que suas casas, construídas, nos despenhadeiros, equilibravam-se em palafitas de tabuas e restos de ferragens, e que logo, dariam lugar ao mais lindo hotel. Orgulhava-se.
Porem, neste bairro, de casas simples, também mora gente. Excluídos, e certo, a margem da sociedade, lutam de toda maneira para sobreviverem. Neste mesmo bairro, numa casa, das mais simples, acordam uma criança e sua mãe, que se deram ao luxo, de dormirem ate mais tarde, este dia, devida ser véspera de natal. Olhariam as lojas. Sonhariam. Lembraram-se do dia anterior, onde acordaram bem cedo, antes do sol raiar, e sacos nas mãos, rumaram para o lixão, à cata de coisas, sobra dos ricos, concorrendo com os urubus, aos sobejos. Não tiveram sorte. Pegaram uns restos de papelão, outros de jornais velhos, recipientes de plásticos, que seriam vendidos por preços irrisórios. Eram como os urubus, os higienizadores da natureza. Pobres famílias! 
Chegaram à primeira loja. Por detrás de vidros polidos brilhavam o sonho. Havia brinquedos movidos à pilha, controle remoto e todos os produtos importados de ricos países.
 
- Mãe!
 
- Que e?
 
- Escrevi outra carta! Os olhos brilharam.
 
- Pra quem filho?
 
- Pra quem mãe! Pro Papai Noel!
 
- Mas você não se emenda filho! Maneou a cabeça, em desesperança.
 
- Essa vez eu pedi coisa mais simples mãe! Levemente triste.
 
- Esqueci a bicicleta. E coisa grande! Só para os ricos! Apalpando os bolsos.
Hoje a criança estava feliz. Achara um revolver de plástico, igual ao de John Wayne, e com ele no bolso, sacava-o a todo instante, talvez treinando para um duelo fictício. 
-Pedi uma bola de futebol! E de repente saiu correndo com uma bola invisível no pe, deu um drible, parou, mais um, agora tocou a pelota no chão, ajeitou para a esquerda e deu um chute no ar, esperou um momento, acompanhou a trajetória da bola, esticou a cabeça e gritou:Goooooooooooooool!
 
-Menino!
 
-O que mãe?
 
-Para de grito!Não ver que ta chamando a atenção!
 
Os transeuntes fugiam de seu encontro. Não queriam ver a pobreza, tão escancarada em suas vistas. Passavam ao largo, apressados. Alguém, com do dos maltrapilhos, afundou a mão em um dos bolsos, e de longe, jogou uma moeda, das menores, e que o menino começava a correr em sua direção, em catá-la, quando sua mãe gritou:
 
-Não pedimos esmolas! Vivemos sofríveis e verdade, mas vivemos do nosso trabalho. Pegou da mão do menino, e saiu desconcertada. “Não precisamos de esmolas!”.
 
O homem catou a moeda e emendou: Miseráveis e orgulhosos! Era só o que faltava! E saiu pisando duro.
 
Agora o menino já se entretém, olhando outras vitrines.
 
-Mãe!
 
-Anh!
 
-Quem e aquele menino? Apontando o dedo.
 
-O menino Jesus!
 
-Ele e tão bonitinho! Parece meu irmãozinho que morreu! Não e mãe?
 
-E.
 
Silencio.
 
Pensativo.
 
-Ele e filho de quem mãe?
 
-Filho de Deus meu filho! Olhando pro alto.
 
-Que bom ser filho de Deus mãe! Pegando um pedaço de pão velho dos bolsos, e comendo vagarosamente.
 
-Queria ser também.
 
-Mas você e filho! Emocionada. Todos nos!
 
Pensativo. Agora tirando o miolo do pão e jogando aos pombos.
 
-Não sei! Não nos parecemos nada, mãe!
 
Olha-se no espelho. Mira-se demoradamente.

-Ele e tão coradinho! E olhe minhas mãos! Espalma as mãos esqueléticas. 
-Onde posso encontrá-lo mãe? Vagamente. 
-Acho que em qualquer lugar filho! E saíram subindo a rua olhando ora de um lado ora de outro, e o menino corria de encontro aos pombos, que voavam baixo e que de repente, voltavam em circulo atrás dos nacos de pão.
Noutra rua, próximo dali, o homem do carro preto, falava ao celular. Ver-se que se veste de Papai Noel e que tem uma longa barba branca. Vai participar das festas de fim de ano de sua empresa. Grita arrogante: 
-Não quero qualquer bebida! Quero champanhe francês! Vamos comemorar. Foi uma grande vitória! Os mortos de fome têm que sair! Ganhei uma bela bolada! 
Lá fora cai uma chuva fininha. Liga o desembaçador. Para no sinal vermelho. Ato reflexo olha em todas as direções. Um menino bate levemente no vidro e o assusta. São os vendedores de sinal, “meninos de rua”, de todos os tamanhos, ajudando a complementar a renda familiar. Oferece guloseimas. “Como aquele menino se aproximou furtivamente, sem conseguir vê-lo”. Rápido levanta os vidros, e com o dedo acena negativamente. Há uma tensão no ar. Nas mãos do menino, surge uma arma. Com olhos injetados de sangue grita loucamente. 
-O dinheiro tio! 
No olhar do homem, o rancor, a avareza. Comprimem-se todo com ódio e acelera bruscamente. Escutam-se estampidos. Cheiro de pólvora paira no ar. Gritos.  Sinal verde. Todos avançam sem se importar. O carro preto começa uma corrida vertiginosa, queimando o asfalto em derrapagens. Os vidros voam em pedaços estilhaçados. Desliza de um lado para o outro em zig zag indo colidir no parapeito da pista. Com o choque o capo, se levanta, subindo vapores de água fervente. Num átimo, um corpo crivado de bala, peito caído sobre o volante, boca aberta em agonia, inerte. Sirenes agudas cortam a noite quebrando o silencio. O menino arma em punho, mãos vazias, barriga vazia, corre, sumindo na escuridão. Vida vazia. A policia interdita a rua, os paramédicos chegam, e a noticia corre.
No outro quarteirão, o outro menino corre em direção a mãe quase mudo. 
-Mãe! Mataram o Papai Noel, mãe! As lagrimas desciam dos olhos fundos. Agora ele não vai poder atender meu pedido. Tosse. Das narinas descem catarros viscosos. Seu ventre fundo balança-se em soluços. 
-Não filho! Não e assim. Tentando acalma-lo. 
-E sim mãe! Vi agora na televisão. Deram seis tiros nele! Coitado! 
-Agora nem bicicleta nem bola! E talvez para sempre… Ele morreu! Falou resignado. 
-E melhor irmos embora! E saíram apressadamente, pequenos na noite. De vez em quando, uns e outros lhes apontavam os dedos. Não compreendiam. 
-Parados ai! Viraram-se subitamente. 
A rua apinhara-se de gente. Tinham muitos policiais, e todos lhes apontavam armas. 
Eram suspeitos. Pretos e pobres. O retrato falado. O menino também tinha treze anos. Assemelhavam-se 
O menino pensou que era brincadeira e levou as mãos nos bolsos, e como o mocinho dos filmes americanos, sacara sua arma de brinquedo. Pobre menino! Caiu crivado de balas, sem dar um grito. Sua mãe chorava copiosamente. 
-Bandidos! Mataram meu pobre menino! 
-Mãe! Estou segurando as mãos de Deus! Sorri. 
-Não meu filho! Queria dizer uma coisa. 
-O que mãe? 
-Que talvez ele não exista! 
-Não mãe! Agora estou nos braços Dele e Ele sorri para mim! 
“Venham a mim todas as criancinhas” Os sinos dobraram pesadamente doze vezes. Estampidos de fogos são ouvidos ininterruptamente. Feliz Natal! Gritam. 
Ao longe, muito alem, numa manjedoura, nasce o filho de Deus, corado, gordinho, e rodeado de presentes dos reis, enquanto, ali no asfalto, jaz um de seus filhos, magro e maltrapilho. Um inocente.

Contomeuscontos-Literatura-Crônicas: Artigo

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segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

O Facebook







Numa fila de banco, enquanto pagava contas, a minha frente um rapaz e uma moça conversavam tranquilamente e ouvimos eu e mais um monte de gente  essa história, que não chega a ser história nem conto, apenas afirmativas aleatórias sobre algo tão em voga nos dias de hoje. Já que não tinha nada para fazer, a não ser ouvir, abri meu pavilhão auditivo isto é a orelha mesmo e deliciei-me com a conversa.

Ele falava para uma garota e esta confirmava tudo com um sorriso maroto. As pessoa em voltas faziam caras e bocas. Era como ouvir sem querer um telefonema particular como fazem nos dias de hoje com os fatídicos celulares. Pois bem. De tempos em tempos soava a companhia do caixa. plim! A fila andava.
(Rapaz): - Não te conheço de algum lugar?
(Eu):  “ Essa frase é velha, mas cabe nos dias de hoje.”
(Garota): - Pode ser! Tenho Facebook.
(Rapaz):  - Já usei muito, logo no início, mas agora, estão passando dos limites. Veja e me fale depois se não tenho razão. As pessoas tentam de toda forma parecerem felizes.
(Todos): Hummmmm!
(Garota): - Também uso bastante. Não vejo nada de anormal.
(Rapaz):  Ah! Claro que tem. Colocam fotos de tudo. Da sala, do quarto, deitadas, em carros, dançando, pulando, correndo. No perfil escrevem logo se namorando, separando, casados, traindo...
(todos): Tc-tc-tc-tc-tc-tc.
(Garota): - É a pura verdade. Mas a finalidade é essa. É unir as pessoas. Tenho vários amigos assim. Coloca toda sua vida, como um livro aberto.  Escancarada mesmo. É como olhar pelo buraco da fechadura.
(Rapaz):  -  Kkkkkkkkkkk.  Até fotos de churrasco eles mandam.
(Garota): - Normal. Do pessoal?
(Rapaz): - Não, da carne, na churrasqueira.
(Eu): Sorrindo para dentro.  -KKKKKKKKKKKK.
(Rapaz): - Tem de tudo. Dos fanáticos por times:
-ORGULHO DE SER RUBRO-NEGRO! Orgulho de ser Botafoguense! Orgulho de ser Vascaíno! Tudo vira motivo de orgulho.
(Garota entrando na dele): Orgulho de ser Guei. (Abrasileirado), orgulho de ser sapatão, orgulho de ser hetero. Até orgulho de ser homo sapiens!
(Rapaz): - As meninas vestem o melhor vestido e tiram fotos de tudo que é tipo. Dá até para conhecer as que colocaram silicone.
(Garota):  - Isso é a pura verdade. Geralmente colocam uma blusa decotada, e sorriem como dizendo nas entrelinhas para as colegas:   Morram de inveja. Só faltam colocar a quantidade, como coisas do tipo: 180 ml. Uma mais afoita: 300 ml.
(Rapaz):  - Umas desfrutáveis!
(Garota):  - Não é o meu caso. Todos indiscriminadamente olham para seu decote. São meus mesmos. Revela.
O Rapaz olha disfarçado.
Eu me contorço todinho ,mas o que  consigo , é uma dor na coluna, e  ver a pele do pescoço dela, puro pêssego, subir e descer no toque do coração.
(Garota):  - E os gurus? São muitos.  "Fé não é achar que Deus fará tudo o que você quiser. Fé é crer que Ele fará o que é melhor pra você."  Dá um livro de auto ajuda   hehehehehe!
(Rapaz):  - Outras falam coisas do tipo:
-Fui ali ser feliz. O que entendemos?  O óbvio.  Que foi transar e que já, volta.
(Garota):  - É mesmo, colocando a mão no ombro do rapaz:   - Só falta  uma foto daquelas de propaganda dos consultórios:  Antes e depois.
Antes: Toda penteada, batom vermelho, sorriso.
Depois: Toda despenteada, manchada de batom e cara indefinida. (Não se sabe se foi bom ou não).
(Eu): -“Está quase na malha do Don Juan”.
(Rapaz): - Muitos fazem apologia à bebida. Só tiram fotos com garrafas na mão. O pior quando querem enfiá-las noutro lugar.
(Garota): - Esses são os homens!  Os machos! Os fortes!
(Rapaz):  - Com certeza. Mas  vocês  adoram  mandar recado diretos tipo:
-Não me julgue, você sabe meu nome, não minha história.
(Garota): - Isso mesmo, e cai na risada.
(Eu):  ”Está virando guerra dos sexos”. Não demoram  trocam MSN.
(Rapaz):  - Um dia desses quase morro de ri. Uma garota postou uma foto no banheiro, e não notou que bem atrás a mãe dela estava sentada no trono.  Virou sucesso. Um sucesso que não queria. Kkkkkkkk!  Um milhão de cliques aquela semana.
(Eu): “ A garota tá ficando vermelha....”
(Garota):  - Mas aquela da foto sou eu, ela diz. E  aí ele se sente caindo num vaso, sem base.
Diz gaguejando tentando consertar: 
(Rapaz): - Ah! Não liga não! Todo mundo faz merda mesmo!
E só conseguiu  ri depois que a pretendente saiu acelerada de raiva.
(Eu):  -KKKKKKKKK. Que mico! Todos riram. Completei:
-Bem feito! Quem manda ter facebook!