sexta-feira, 22 de julho de 2016

Caprice

   


                                                                      Caprice


                  As architecting verses so perverse universe?

                 I confess that

                                                                                             in the poem-do,
                  the sit at the window,
                                                                                             I wish to always
                  build the beautiful,
                  the romanesco, 
                  The simple.                                                        But what I see
                  in external?
                   ... Scourges scourges scourges ... 
                   So the verse is born so crooked
                  almost dead. 
                   Without cadence,
                   like a strong gust of wind,
                                                                                                 shrill gun shot,
                   Felling innocent,
                                                                                            Words that appear erratic, 
                   from an old dictionary


Tradução- 

A arte imita a vida




                                          A  arte imita a vida



          O menino escutou a notícia pela tia. Valha meu Deus!, Seu Manuel sofreu um derrame e  agora está na mesa de cirurgia. Tá morre e não morre.

          Esta notícia o abateu, justamente na hora que ia jogar a bola de gude  à valer. Tinha apostado tudo, coitado. O dedo tremeu na hora do último buraco.
 Pedrinho aproveitou e gritou limpo!,   O burro quando viu que ia errar era só ter gritado sujo!
E aí tinha alguma chance. Mas não! Perdeu. O adversário  rindo. Entregou as bolinhas  que amava.

 Também pudera! Seu Manuel  era seu pai.

           Nem terminou o jogo, coitado. Saiu correndo esquecendo-se até dos chinelos, tinha consertado no dia anterior com um prego.

“Filho não fique por aí, estude, estude, é a única coisa que vai te diferenciar dos outros!”. Martelo na cabeça. Ouvia.

          Quando chegou a casa, encontrou a mãe, na cozinha, esfregando as mãos uma na outra, as tias sentadas no sofá, os primos esparramados pelo quintal, sem respeitar seu canto, e a chaleira de café no fogo.  Ela o abraçou e danou a chorar. Nos olhos tudo. A tristeza.

          É a vida ! É a vida! Diziam.

É bom dizer que Silvio era meu melhor amigo, e depois que um tio dele disse-lhe “esse menino no mínimo vai ser um escritor, ele é detalhista!”, ele passou a agir como tal e anotar tudo.
Ele tinha um caderno de capa grossa que não deixava ninguém, mas ninguém mesmo chegar perto. E quando ele se viu em casa esse dia, trancou-se no quarto.


          Agora são 10h e 30m “Meu pai sofreu um derrame! Agora é esperar a vontade de Deus disse minha mãe!” Esperar é o que resta. Ajoelhei e rezei.

O dia logo chegou ao fim e no outro dia foi visitar o pai.

          14 h - “Meu pai parecia um robô de guerra nas estrelas. Tinha tubo enfiado na boca e no nariz. No monitor corria uma linha trêmula acompanhado pelo som de um bip. O som da respiração era de filme de terror, quando a mocinha estava com medo. Minha mãe não quis comer  comida de hospital e eu tirei a barriga da miséria”.

          6h- uma semana depois- “Trouxeram meu pai numa ambulância. Antes já tinham preparado o quarto com uma cama de ferro daquelas de hospital e colocado penico embaixo”.

          11h-“O quarto do meio ficou sendo o mais visitado. Numa mesinha de cabeceira ficava entupida de remédios e cheiro de álcool”.

          15 h -Um dia,um mês, não lembro- “Depois de um tempo indo até a porta e voltando, tive coragem de entrar, aproveitando que meu pai estava só. Nesse dia segurei em sua mão, a que não estava amarrada. Faziam isso, segundo eu soube, era para ele não se machucar. Ele apertou muito e eu quase chorei. Os olhos dele estavam parados, ausente. Dizem que ele pode saber tudo, tenho minhas dúvidas”.

     16h- "Uma esperança pousou. Ela ficou na janela um tempo, veio voando do jardim e entrou no quarto pela janela entreaberta. Esse fato nos deixou sorridentes".

     16h do outro dia- "Ele faz fisioterapia para recuperar algum movimento".

     09h mês de junho- "Ele não recuperou nenhum movimento. Alimenta-se por sonda, faz xixi por um cano. O cabelo branqueou todo. Deve ser por que agora não pode pintá-los.

      16h do mesmo dia- "Não te conto nada! Hoje ao escurecer veio um camaleão e comeu a esperança.

      18h três meses depois- "Plantei um feijão num copo dois dias atrás. Hoje olhei. Tem uma folhinha e umas linhas que deve ser raiz. Acho que brotou. A árvore só precisa de água para viver. A gente é muito complexo.

      09 de domingo- "Plantei o feijão no jardim. Ele agora tem duas folhas."

      09 h segunda feira- " O pé de feijão perdeu uma folha. Estava nas costas de uma formiga. Fiquei com ódio dela! Vou ficar mais de olho".

      09 h primeiro dia de férias- A rama do feijão invadiu as roseiras, e subiu a janela do quarto. Meu pai não viu. No tempo que ele andava ainda, era responsável em tirar todas as ervas daninhas".

      12 h segundo dia de férias- "Tudo depende de cuidados. O jardim, as plantas e principalmente meu pai".

          16h seis meses depois-“Domingo passado ele recebeu uma visita, e quando essa visita entrou no quarto meu pai caiu no choro. Foi a primeira vez que o vi chorar. Meu tio ficou desconsertado”.

          18h-“A verdade é que meu pai e esse tio têm uma rixa antiga, coisa de família”.

          12h- cinco anos depois- “Meu pai alimenta-se por sonda. É a dieta que o médico passou. Creio que é para dar-lhe saúde.  Aprendi saber se tudo esta normal. Sua urina é bem clara, sinal que está bem tratado, bem hidratado. A respiração calma, a pele lisa sem feridas. Ah! Ia me esquecendo. Fiz quinze anos hoje.

          1h da manhã-“Meu pai acordou soluçando. A cuidadora falou que não precisava se preocupar. Era somente um sonho triste”. Esse dia eu não consegui dormir. Fiquei pensando na eternidade. Alguém teria uma vida tão boa que desejasse a eternidade?

          6 da manhã de um dia qualquer- “A cuidadora estava dando banho nele. Era para ter higiene, para não dá feridas, para ele ficar mais confortável. O corpo parado ele fica doente. Quando morto deteriora”.

          12h-  10 anos depois -A casa voltou à normalidade. Todos entram e sai, conversam sobre qualquer assunto, dão risada, eu me acostumei com ele deitado, os olhos fixos,  o volume do corpo sob os lençóis brancos, os cabelos branquinhos...

          Meia noite de um dia de lua qualquer:  Agora passo os dias trancado no quarto.

“Numa manhã ao despertar de sonhos inquietantes,  Gregor Samsa, deu por si na cama transformado, em algo indeterminado”.

          18h-  Hora do Angelus, com a ave Maria de Gounod – A canção rompe as barreiras, atravessa os muros, os corações...

Gregor,   desviou então a vista para a janela e deu com o céu nublado - ouviam-se os pingos de chuva a baterem na calha da janela e isso o fez sentir-se bastante mel­ancólico. Não seria melhor dormir um pouco e esquecer todo este delírio?

          12 h de uma manhã fria-  Minha mãe bateu á porta.  Filho venha comer algo! Não fique nesse quarto o dia todo fechado! Pode adoecer! Ela estava pálida. -Sim minha mãe, estou lendo um pouco, daqui a instantes irei.

Aquela voz suave! Gregor,  teve um choque ao ouvir a sua própria voz responder-lhe, inequivocamente a sua voz, é certo, mas com um horrível e persistente guincho chilreante como fundo sonoro...

          17 de setembro-  Aniversário de meu pai-  A casa era silencio. Só o tic e tac do relógio da sala.  Oitenta e seis anos. Manhã fria de setembro. Eu estava na sacada lendo.  Minha mãe falou:  Coitado, faz 12 anos...12 anos... Toda uma vida!  Ficamos calados. Depois ela saiu. Continuei a leitura.

Pensou na família com ternura e amor. A sua decisão de partir era, se possível, ainda mais firme do que a da irmã. Deixou-se ficar naquele estado de vaga e calma meditação até o relógio da torre bater as três da manhã. Uma vez mais, os primeiros alvores do mundo que havia para além da janela penetraram-lhe a consciência. Depois, a cabeça pendeu-lhe inevitavelmente para o chão e de suas narinas saiu um último e débil suspiro.

          13h – Uma quarta feira santa- Um telefonema: 
          "-Mamãe...
         -O que é que tem?   -
         -Ela...
         -Fala! 
          -... 
         -Nossa mãe se foi...”




Nota do autor: 
Encertos do conto A metamorfose de Kafka.