quarta-feira, 14 de julho de 2021

Situação análoga


                






                   Situações análogas 




"Meu inconsciente cria fantasias que minha mente sã nunca ousaria imaginar."

Sigmund Freud

 

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      Ele estava fazendo sessenta e quatro anos naquele dia quando sentiu uma pontada forte no peito. Correu ao médico. Um pequeno infarto. Precisaria de descanso e um pouco de exercício. Logo volta tudo ao normal disse o médico. Mas eu que tenho tanta coisa para fazer, pensar... Tira umas férias disse por fim o médico.  

Procrastinou o máximo que pôde mas, o velho medo da morte venceu. Como disse bem Drumond de Andrade:

..."o medo grande dos sertões, dos mares, dos desertos,

o medo dos soldados, o medo das mães, o medo das igrejas,

cantaremos o medo dos ditadores, o medo dos democratas,

cantaremos o medo da morte e o medo de depois da morte,

depois morreremos de medo".


Para completar ele estava convalescendo de uma gripe mal curada mas, feliz depois que fez o teste que excluiu a covid e o médico prescreveu vitamina c e cama. 

Não tinha como esconder 

que a “boa idade” como chamam hoje, trás: saudade da vida passada principalmente quando vê uma bela mulher,  “elástica,  com  uma  pele  suave  da  cor  do  pão  e  olhos  de  amêndoas verdes,  e  tinha  o  cabelo  liso  e  negro  e  longo  até  as  costas”. Este era o perfil físico da jovem que Gabriel Garcia Márquez descreveu tão bem no conto que leu há pouco: “O avião da bela adormecida”. 


Enquanto entrava no carro, jogava o livro no banco de trás e abaixava o vidro pensou: O que tinha para viver era menos do que viveu até agora e precisava aproveitar da melhor forma possível o que lhe restava. Mas não estava fácil principalmente por causa da pandemia. E todos estavam guardando distâncias seguindo protocolos rígidos pelo mundo a fora. Dava graças a Deus por ter  se vacinado passado da fase vermelha para a amarela, pois finalmente estava caindo o número de contágio.

Assim  releu várias coisas e principalmente esse conto que relatava o sonho de um  homem de meia idade em encontrar a luxúria nos braços de uma jovem e bela mulher e isso lhe dava alguns comichões não para o ato em si mas, se tivesse uma mulher, uma bela mulher  para observá-la sem pressa um longo tempo em todos os detalhes como uma obra de arte aí pensou na  "A maja nua", obra de 1800, de Goya. Que na época escandalizou a sociedade e foi processado pela inquisição. Depois com "Olympia", 1863 de Édouard Manet que foi influenciado pela obra  "Vênus de Urbino, 1534 de Ticiano.  E no auge da observação a obra "I'origine Du Monde", 1866 de Gustave Courbet obra essa que retrata a vagina em close de uma mulher deitada.  

Estacionou nos arredores.

Depois de procrastinar muito resolveu  fazer uma pequenas caminhadas pela vizinhança. A paisagem  estava como bem pintou Vincent van Gogh "A Noite Estrelada". A pintura retrata a vista da janela de um quarto do hospício de Saint-Rémy-de-Provence, cidade da França pouco antes do nascer do sol onde ele estava internado depois de ter provocado automutilação da orelha esquerda. São pinceladas vigorosas de azul anil.


Incrível como depois de dias recluso tudo fica mais belo, colorido , profundo e empolgante. Deve ser o sentimento dos encarcerados, pensou.

Começou com  passos largos, ouvindo o estalar dos cascalhos sob o tênis, a brisa na pele. Logo o telefone tocou.

Era a empresa de telefonia móvel ligando pela décima vez cobrando uma conta já paga e a voz feminina educadamente dizia por fim que se a conta já estivesse sido paga que desconsiderasse. Ele parou.

      -Vá para a puta que o pariu ele disse. Sempre é a mesma coisa. Me acordou cedo hoje, desconsiderar ? Vá se danar ele replicou. Desligou.

Foi assim que ele chegou ao encontro: Puto e mau humorado. 

Hoje os casais chegam aos “finalmente” para depois perguntar pelo nome, emprego e outras coisas mais, pensou. No meu tempo, para pegar na mão da garota era a maior dificuldade. Tinha que conhecer os pais, sentar-se na sala, pedir em namoro.


A garota no entanto já o esperava . Os olhos semiaberto, sussurrou baixinho Um bom dia preguiçoso. Vestia-se com uma calça legging preta. O cabelo preso em rabo de cavalo. Uma bela mulher.  Logo ensaiou   uma posição que constava certamente do Kama Sutra, o sábio ou sacana indiano que treinou  todas as posições sexuais possíveis e catalogou-as num manuscrito.

 Começou os primeiros movimentos. Os cabelos caíram-lhes sobre os seios rígidos. Os alto-falantes tocava uma música de batida forte. Um tum tum tum no ritmo do coração. 

Deitou de barriga para cima. Sentiu o perfume dela. Suave.

Todos os dias se encontravan a mesma hora, no mesmo lugar. Maira era seu nome. Ele a conheceu a pouco tempo, pescando sua vida nos diálogos soltos que ouvia com as amigas. 

      -Nossa! Fiquei na festa até o o dia raiar. Estou morta! Disse uma

      -Finalmente passei na OAB. Disse ela.

Advogada, pensou. Defendeu tese. A tese nada mais é do que a ideia central de um texto. Ela é o ponto de vista. E ponto de vista há vários. Depende de quem olha. Ela é um “ tesão” observou.

Tirou o sobretudo. Lá fora o frio de início de inverno. Julho. Mudou de posição. Parecia um louva a deus. Deitou-se e começou um movimento ritmado para cima e para baixo. Essa posição entraria até os "bagos" pensou.  Sentiu que ela fazia um esforço tremendo. Assim a  respiração se tornou cada vez mais ofegante. Uma gota de suor caíra-lhe da testa. Ela enxugou com um lencinho branco. Chegou  a ouvir o coração palpitando mais rápido.

Quando ela descia dava um gritinho  como os jogadores de tênis. Vem das artes marciais.  é um termo das artes marciais japonesas que se refere à exteriorização da energia corporal, que nasceria desde o baixo ventre,localizado aproximadamente cinco centímetros abaixo do umbigo . A manifestação pode se dar em três momentos: no início de uma atividade; durante sua realização; ou a seu fim. 

E ela estava batendo um bolão. Que energia. No rosto dela a expressão de prazer e dor. É a serotonina pensou.

Ele  tentou acompanhar os movimentos dela. No ritmo. Ela descendo, ele subindo.  No mesmo sincronismo. Num vai vem de músculos e um sobe e dece de carnes na fruição dos corpos suados.

“De acordo com um  estudo o gasto calórico da atividade sexual é de 4 calorias por minuto para homens e de 3 calorias por minuto para mulheres, com um equivalente metabólico semelhante ao de uma caminhada a 6 km/h. Portanto, para uma relação de 30 minutos de duração, o gasto calórico aproximado seria de 120 calorias.”


Ela ficou de cócoras. Dava para vê no espelho toda a suas costas e a bunda perfeita. E com os movimentos fortes seus seios pulavam e seus cabelos balançavam em ondas rítmicas perfeita. 

Ele mudou de posição e colocou as mãos sob a nuca.

Deu umas vinte estocadas forte para cima. Sentindo os músculos tesos. 

Desprendeu-se de seu corpo um cheiro doce de sangue e suor. Para ele o perfume era inebriante.


“E como em qualquer forma de atividade física, a queima de calorias na atividade sexual vai depender da sua intensidade e duração.”


Ela aumentou e ritmo e ele a acompanhava.

Sua respiração estava como uma cuícas na roda de samba. Quando ela inspirava ele expirava. E vice e versa. Parecia um balé, um tango, um bolero , uma dança bem ensaiada.


“De acordo com um médico não recordo o nome, disse ele: é interessante pontuar que fatores como o tipo de relação (sexo oral, com ou sem penetração etc), a posição utilizada e a ocorrência ou não de orgasmos também influenciam no gasto calórico total.”

Aí mandaram ver.

Agora ele já não sentia o cansaço e as dores do início. 


“A organização Mundial da Saúde (OMS), diz que para se romper a barreira do sedentarismo, as pessoas precisam gastar pelo menos 2.200 calorias por semana com atividades físicas. Supondo-se uma relação de 30 minutos de atividade, incluindo preliminares mais ativas, no sentido de garantir um esforço físico de moderada intensidade (6 METS, sigla para Equivalente Metabólico da Tarefa), os homens precisariam ter em torno de 18 relações sexuais por semana e as mulheres, 24 relações.”


Continuaram os movimentos de vai e vem.

Ela parou um instante para recobrar a respiração e ele aproveitou para a observar pelo espelho. A bunda perfeita. Uma medalhinha de ouro pendia do pescoço esguio e suado.

Súbito ela ficou de quatro. Movimentou-se como um gato espreguiçando-se calma,  lânguida. 

Que abundância!

O côncavo e o convexo.


“O sexo é mais uma atividade que, somada a outras, ajuda a mandar o comportamento sedentário embora. E sem sofrimento, já que, nesse caso, prazer é fundamental.”


Maíra levantou-se. Vestiu o sobretudo. Tomou todo o líquido da garrafinha e despediu-se com um belo sorriso. 

Ele ficou mais um tempo.Tinha que terminar sua série de abdominais perder gordura localizada e resolver velhos problemas. Por fim saiu da academia.

Poderia ter sido uma boa transa, ele pensou.    

Mas como diz a lei: sem  "emissio seminis" ,sem cópula.