sábado, 20 de março de 2010

Pindorama



Irerê quando saiu da floresta para a praia, achou que era o único morador daquele mundo. Saiu assim mesmo pelado, foi banhar-se na manhã fria, sentindo os peixes beliscarem seu sexo, e ficou ali deitado, curtindo a imagem exuberante das matas, o azul do céu, o horizonte liso. Olhou para trás de si e viu a floresta densa, escondendo sua morada, toda sua família achava-se protegida, pela mãe terra, e sorriu de tanta felicidade.

Nesse momento, olhou estupefato, duas vezes para o horizonte agora enrugado. O que seria aquilo Tupã, deus misericordioso, pensou, levando às mãos a boca. Algo grande boiava, nas águas e se dirigiam em sua direção. Pensou nos filhos e mulher na oca, inocentes em seu descanso. Desconfiado notou, que do grande bicho, saíram dois filhotes que pareciam taturanas com as pernas nadando ao seu encontro.

Saiu da água de um pulo só. Sem roupas pegou uma folha de bananeira e cobriu as suas safadezas. Os seres estranhos, “branquelos”, pararam as margens e desceram com grandes artes na cabeça, olharam para ele e pensaram: “São simples andam nus e facilmente ludibriáveis.” Andaram na praia, olhou as matas, o céu... Viu que um deles tomava nota de tudo, escrevendo.

-Caminha! Caminha! Veja que aves tão lindas. Duas araras namoravam numa árvore. Irerê não perdia nada, observava que os brancos pisavam em utensílios de couro, não andavam descalços, e cobriam suas vergonhas completamente.
-Que calmaria. Depois vieram as correntes marítimas, por sorte descobrimos esse paraíso, mais riquezas para nosso rei.
-Muito bem, desfraldem a bandeira. Declaro por Deus e pelo rei sermos donos de toda essa ilha, e de tudo que nela exista.
-Cabral: dou ordem para baixarem as velas da “Pinta” e “Nina”?
-Claro! Claro! Vamos pernoitar aqui. Montem as barracas.
Homens cortavam paus aplainava o chão e Irerê os observava quietos, no canto. Três homens que pareciam serem chefes adiantaram em sua direção.
-Raios! Falou um deles, já vi esse filme antes.
-Parece que foi ontem, hehehehehe!
-Ofereçam presentes para ele. Coloquem ali para ver se ele se aproxima.
Irerê aprofundou-se na mata e em meia hora voltou com toda a tribo. Olhavam extasiados para os objetos, espelhos principalmente, e fitavam-se olhando seus espíritos.
-Uns ignorantes. Vejam como são vaidosos, olham-se sem parar.
-Você acha que nossa civilização tem muito que ensinar para eles?
-Sem dúvidas sem dúvidas!
-Senhores: Aqui estou pensando com meus botões, se pudéssemos levar para a corte, um espécime desses, que sucesso faria.
Oh! -Oh!-Oh!-Oh! –A nossa rainha ficaria louca!
-É pena, mas não viemos para isso? Queríamos descobrir o caminho para as Índias. Deixemos para os futuros colonizadores.

Era um belo dia de abril. As araras voavam em algazarras, como crianças a brincar, gaivotas paravam no vento e mergulhavam nas águas azuis trazendo pequenos peixes no bico, as ondas quebrava em estrondos, o vento ricocheteava nas árvores cantando uma estranha melodia. Irerê pensava: “Tupã finalmente ouviu minhas preces. Será minha salvação e de todo o meu povo. Com a amizade desse povo e todo o seu poder nos protegerá de nossos inimigos.”

Foram convidados para subirem nas caravelas. Eram construções grandiosas, jamais vista pelo seu povo, sonhava conseguir todo aquele poder, toda a fortuna que a vida dá.
Nessa noite e nas subseqüentes o Pajé e toda a tribo rezaram agradecendo á benção conseguida.
Na manhã do sétimo dia as caravelas zarparam levando ouro, a casca de uma árvore com tinta rubra e presentes, prometendo logo voltarem para ensinarem toda uma cultura, mostrarem um novo Deus, e a salvação eterna.
Irerê ficara só, na praia, olhando o horizonte, até que ficasse liso e sentiu um aperto no peito, uma grande solidão lhe abatera no meio da mata, sonhava sem saber quão perigoso são os sonhos.

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